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1 de nov. de 2011

Resíduos sólidos – uma questão de justiça ambiental


Crédito da imagem: BBC
Neste artigo trato da questão relacionada a transferência de resíduos sólidos entre países e sua relação com o tema da justiça ambiental. Escrevo motivado pelas recentes notícias amplamente divulgadas na mídia sobre a remessa de lençóis e outros resíduos hospitalares dos EUA para o Brasil. Este, com certeza, não é um caso isolado, nem em se tratando de âmbito nacional, muito menos mundial. Para refrescar a memória, vou citar alguns:

Em agosto de 2009 foram interceptadas cargas nos portos de Rio Grande (RS), Caxias do Sul (RS) e Santos (SP) totalizando aproximadamente mil toneladas de resíduos orgânicos, hospitalares e eletrônicos. Os containers com os resíduos foram enviados de forma ilegal do Reino Unido. Um ano após este caso, novamente no Porto Grande (RS), a Receita Federal interceptou uma carga contendo 22 toneladas de resíduos domésticos provenientes da República Tcheca. No início de outubro deste ano, no Porto de Suape (PE) foram identificadas duas remessas ilegais de resíduos hospitalares, totalizando cerca de 47 toneladas, enviadas dos Estados Unidos. Em todos estes casos, a documentação descrevia a carga como material para reciclagem, na tentativa de burlar a fiscalização.

Em âmbito internacional, visando coibir casos como estes citados acima e regulamentar a movimentação transfronteiriça de resíduos sólidos, foi promulgada em março de 1989 o texto final da Convenção da Basiléia, que entrou em vigor em 1992 e tem atualmente 178 Estados-partes, dentre os quais o Brasil. Dentre os principais objetivos da convenção estão: 
  • A redução da geração de resíduos perigosos e a promoção do manejo ambientalmente saudável dos resíduos perigosos, seja qual for o local de disposição;
  • A restrição da movimentação transfronteiriça de resíduos perigosos, salvo se for realizado de acordo com os princípios da gestão ecológica;
  • Ser um sistema regulamentar aplicável aos casos em que a movimentação transfronteiriça for permitida.
Em âmbito nacional a recente Política Nacional de Resíduos Sólidos (lei n° 12305/2010), proíbe a importação de resíduos sólidos perigosos e rejeitos cujas características causem dano ao meio ambiente e à saúde pública.

Dado este quadro geral, eu me pergunto – como esta porcariada toda veio parar aqui, dado que existe ordenamento jurídico para impedir isso? E eu aqui com meus botões fico refletindo e só consigo chegar a uma conclusão – só pode ser pegadinha! Onde está a câmera escondida?... Antes fosse...

Retomando os exemplos, notamos que todos os países que exportaram os resíduos pertencem ao dito norte desenvolvido, fazem parte da OCDE e são os donos da bola da economia global. E nós, pertencentes ao sul “ainda chego lá”, mero coadjuvantes, quintal do primeiro mundo, onde eles podem enterrar suas porcarias sem nenhum remorso.

Por trás destes casos está a racionalidade econômica dominante, focada no lucro imediato a qualquer preço e na externalização dos custos para o ambiente e para a sociedade. O envio de resíduos para o Brasil ou para qualquer outro país subdesenvolvido é economicamente atrativo, dado que custos operacionais teriam valores menores relacionados a salários, níveis de preço e custos legais. Na melhor filosofia nimby – not in my backyard (retomando uma idéia do primeiro post deste blog) a exportação dos resíduos dos países ricos para os países pobres viria então em boa hora já que poderiam completar a subpoluição e diminuir o número de almas a passar fome e morrer de doenças que já possuem cura, não somente pelas mortes associadas aos poluentes que seriam emitidos, mas também porque o tratamento destes resíduos iriam fornecer subempregos, com subsalários para subpessoas.

Uma das soluções apontadas para este problema seria a compensação financeira dos países exportadores para aqueles que recebem os resíduos. No entanto, tal solução é inviável e não extingue a injustiça imbutida neste processo, dada a impossibilidade de se precificar bens e serviços que não tem preço, como a saúde de um ser humano ou uma fonte de água limpa. Mas, dada a fragilidade política e econômica dos países pobres, estes acabam por entregar seu futuro em troca de um punhado de esmolas.

De nada adianta legislações e tratados internacionais enquanto houver essa disparidade de poder entre nações e regiões do gobo, a divisão entre norte rico e sul pobre, onde poucos podem e muitos não, onde os ricos consomem e os pobres pagam a conta. Qualquer solução oferecida dentro da lógica do capital não dará conta de solucionar tal disparidade, pois será essencialmente injusta socioambientalmente, pois quem dita as regras é o lado mais pesado da balança.

Um comentário:

Paulo Romero de Farias Neves disse...

Olá amigo,
parabéns pelo blog e pelo trabalho de divulgação e preservação do nosso meio ambiente,através de discussões e boas idéias,é disso que precisamos para diminuir a crescente onda de agressão ao nosso meio ambiente...

Abraço.
Paulo Romero.
Meliponário Braz.