Recentemente li um artigo
que falava a respeito da publicação de um relatório no qual um grupo de cientistas
listaram 21 questões ambientais emergentes para o século XXI. Num primeiro
momento pensei – Só 21!?!? Está bom demais!!! Pensando rapidamente poderia citar...
sei lá?... Um monte: chuva ácida em Manchester, presença de hexaclorocicloexano
em golfinhos, ondas eletromagnéticas cozinhando nossos cérebros, extinção do
bagre-do-dorso-pelado-e-moicano-prateado endêmico do alto São
Francisco (à la Sakamoto)... São tantos os problemas ambientais e sociais dos quais temos notícia que
fica impossível resolvê-los, ou pelos menos, essa é a impressão que nos passam.
No entanto, essa forma de encarar
as questões e problemas é inerente ao nosso paradigma científico, cuja origem
remonta principalmente a Newton, Bacon e Descartes que juntos nos deixaram um
mundo linear, mecânico, previsível e no qual o papel do homem (com “h”
minúsculo mesmo) é explorá-lo e torturá-lo até que este entregue toda sua
riqueza e segredos. Para isso basta dividir o mundo em vários fragmentos. Pegue
um deles e descubra do que é feito e como funciona e daí extrapola-se para o
todo resto e pronto! E quanto mais e menores pedacinhos se dividir melhor.
Essa visão de mundo é reforçada
ainda por uma moral judaico-cristã que separa o Homem do restante da natureza,
nos posicionando fora e acima dela e de todos os demais seres, inclusive do
próprio Homem. O Homem é lobo do Homem (como disse Hobbes, mas não neste contexto) – pobre lobo... Essa moral, extremamente
machista inclusive, também reserva um papel secundário e inferior para mulher,
subjugada ao pai, irmãos, marido. Mero objeto reprodutor a serviço dos
caprichos de seu senhor naquele momento. E creio eu, que dessa mentalidade
deriva-se uma série de consequências também perniciosas e prejudiciais para para
outras minorias (que juntas são a grande maioria) como homossexuais, negros, pagãos...
Mas porque eu estou falando isso
tudo mesmo? Não era pra falar de problemas ambientais? Calma que já vamos
chegar lá. Em seu desenvolvimento o capitalismo se apropriou desses ideais ou
esses ideais deram origem ao capitalismo (para mim todos se retro-alimentam
positivamente, de forma mútua, não sendo possível afirmar quem veio primeiro) de
forma muito profunda e radical. Em sua fase global hegemônica mais recente,
essa visão de mundo e seus valores correlatos foi imposta a todos os povos e
nações, tornando-se a ideologia dominante e única aceita. A coisificação da
vida, a valorização do ter (ao invés do ser), o consumismo exacerbado sustentado na super-exploração do meio ambiente e do homem, que rompe com a
resiliência do planeta e subjuga e segrega homens e mulheres, entre aqueles que
tem e aqueles que não tem – e quem não tem, nada vale.
Vendo assim, percebo que não
temos 21, nem 100, nem 1000 problemas ambientais emergentes para o século XXI.
Pobres cientistas e sua míope visão cartesiana do mundo! Radicalmente, existe
apenas 1 – UM ÚNICO – problema, que não é apenas ambiental, nem social nem
econômico e que muito menos é emergente. Temos um único problema a enfrentar
nesse século que apenas se inicia, sem grandes perspectivas – é verdade! – mas
que se faz urgente, se queremos ter um futuro como espécie. Precisamos romper
definitivamente com a lógica de exploração, consumo e acumulação do Capitalismo
e suas consequencias nefastas a vida, em todos os sentidos.
Homem como espécie, em sua ontogenia,
diferenciou-se dos demais pela capacidade reflexiva e utilização de símbolos
que proporcionam a comunicação. Não estamos separados numa posição superior hierárquica dos demais seres. Estamos juntos, participando da mesma rede da vida que
co-habitam Gaia. Somos essa parcela de Gaia, pensante e reflexiva, com o papel
de guiar essa co-evolução. Estamos, e só nós poderíamos estar, e esta é nossa
grande responsabilidade, com o timão desse grande barco em nossas mãos. Para
onde vamos? Depende de nós. Mas um bom caminho seria na rota de uma
sustentabilidade que provém das ciências
da vida e da ecologia, cuja lógica é circular e includente. Que representa a
tendência dos ecossistemas ao equilíbrio dinâmico, à interdependência e à
cooperação de todos com todos, que privilegia o coletivo, a cooperação e a
co-evolução de todos interconectados. Que respeite a capacidade de resiliência dos ecossistemas. Uma sustentabilidade democrática, justa e
solidária na distribuição dos bônus e dos ônus. Que permita a cada indivíduo se
conhecer naquilo em que é único e essencial e dessa forma livre para se manisfestar, respeitar
e aceitar verdadeiramente o outro e a diversidade, como a expressão mais rica
da vida. Acho que este é um bom começo de um novo caminho.
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