Fonte: www.aldeiagaulesa.net |
Quando fenômenos naturais atingem áreas ou regiões habitadas pelo homem, causando-lhe danos, passam a se chamar desastres naturais. E sinto em tocar neste assunto justamente neste momento em que a grande mídia branda aos 4 ventos os números de atingidos pelas recentes enchentes e deslizamentos ocorridos, principalmente no estado de Santa Catarina, destacando os prejuízos econômicos para o turismo na região. No entanto, não é fácil engolir os argumentos dados como origem para tais desastres naturais.
Sem entrar muito no mérito de como a notícia é difundida na grande mídia, com os repórteres transmitindo o número de vítimas como se estivessem numa competição de quem grita o maior número primeiro, nitidamente de cunho sensacionalista e parcial, os mesmos apontam como causa dos desastres as tais famigeradas mudanças climáticas, de forma que acabam mais desinformando do que informando.
Sabemos que eventos climáticos extremos ocorrem de tempos em tempos, devido à própria dinâmica atmosférica caracterizada por seu comportamento caótico e complexo. Podemos considerar o fato que as mudanças climáticas estão tornando tais eventos extremos mais frequentes com uma certa dose de confiança estatística. Tá! Mas ainda sim, será que não estaríamos, através de nossa interferência míope, fragilizando os ecossistemas, sobre os quais se assentam nossas comunidades e seu estilo de vida moderno?
Culpar tão somente as mudanças climáticas e a “fúria selvagem” da natureza pelas perdas ocorridas é ignorar toda a gama de interrelações e retroalimentações existentes entre os sistemas sociais humanos e os ecossistemas, de tal forma que oculta-se a verdadeira raiz do problema que é o modo de produção dominante, que carrega em seu âmago as injustiças e desigualdades sociais e toda sorte de impactos e degradação ambiental, facilmente identificadas em nossos centros urbanos.
É fato que as catástrofes ambientais não definem classe social para atingir. Não vemos por aí uma tempestade tropical dizendo – Hoje vou derrubar uns barracos no morro e alagar um fundo de vale ocupado por pequenos produtores rurais. Mas essa é a realidade! Os maiores atingidos por alagamentos e desmoronamentos de encostas são aquelas pessoas que vivem nos morros e periferias das cidades, onde a falta de infraestrutura apenas ressalta a contradição e injustiça do sistema capitalista.
E o pior é ter que ouvir muitas vezes alguns dizendo – Também, quem mandou ir morar lá? Não sabia que isso poderia ocorrer? Como se essa população marginalizada (no campo e na cidade) tivesse opção de escolha. Restam-lhe sempre as áreas afastadas, precárias em infraestrutura, serviços e equipamentos públicos, muitas vezes áreas impróprias à ocupação, o que só aumenta as situações de risco a desastres naturais. E essa população que vive nessas áreas não para de crescer, já chegando a 50 milhões no Brasil, ou seja, quase um terço da população do país. Estamos falando de uma classe de pessoas – e eu disse pessoas – sobrevivendo em áreas que naturalmente são propícias a enchentes e deslizamentos, agravadas pela perda de cobertura vegetal, compactação e impermeabilização do solo, lançamento irregular de lixo e esgoto, mudanças no microclima e fragilidade das construções e moradias.
Por outro lado, dentro da lógica capitalista, essas catástrofes naturais são boas, assim como as guerras, pois garantem meios para que grandes empresas expandam seus negócios. Caso clássico das construtoras, que logo se apresentam com a melhor das intenções para reconstruir o local, o que acarreta na elevação do PIB nacional, sinalizando para o resto do mundo que nossa economia vai bem, obrigado! Enquanto isso, as populações pobres atingidas continuam à margem do processo de reconstrução e desenvolvimento, uma vez que esse não é pensado para e com os trabalhadores que moravam lá. Pelo contrário, o desenvolvimento é sempre aquele que privilegia as grandes empresas.
Mas este processo de reconstrução das áreas atingidas acaba saindo mais caro que as ações que seriam necessárias para se evitar essas tragédias. Uma explicação é que as ações de prevenção, para evitar os riscos, não dão tanto lucro para as empreiteiras, grande financiadoras das campanhas de nossos políticos, nem a mesma visibilidade na mídia. Vislumbramos uma situação de total desconsideração com as vidas humanas que vivem em áreas de risco e no discurso das autoridades, um jogo de empurra-empurra pela responsabilidade.
E assim, ano após ano, tragédia após tragédia, vamos seguindo, conformados, pedindo a São Pedro que não mande mais chuvas para nos castigar no próximo ano – afinal, já sofremos o bastante... mas eu acho que não! Afinal, quem mandou Aldo Rebelo lá para Brasília reformular nosso código florestal? Quem foi hein?
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